quinta-feira, 24 de outubro de 2013

AOS 11 ANOS EU...

Homenagem aos 11 anos do Sarau Pegando o Gancho

Recordar esta fase infantil não é algo muito fácil. As memórias se perdem, são fragmentadas, distantes. No entanto, sinto que a arte, do ponto de vista do fazer artístico, ato concreto, tatua as experiências e, enquanto tatuagem vai atravessando o tempo.

Aos 11 anos eu não conheci o mundo digital, que ainda não nos ocupava tanto. A televisão não chegou em casa muito cedo, quando chegou na casa dos vizinhos eu ficava no quintal, olhando de longe, sem ser convidado a entrar. Bem, acho que foi melhor não ser convidado, assim eu explorava mais as brincadeiras de rua e minha criatividade.

“Das lembranças que eu trago na vida, você é a saudade que eu gosto de ter...”. Falo dos instantes lúdicos (Palavra da vida adulta) com Antônio, Diocrécio, Ceça, Cida, Aurélio, Dida, Nenê, Lula, Santo, Claudio, Nainha, Ninha, Ninho, Geovane... Ali na rua da Glória (Hoje sem nenhuma Glória mais!).

 

Este foi o endereço de minhas influências artísticas. Uma ladeira de barro, onde brincava, inclusive, de jogar bola. Imagine! Lembro com carinho de três brincadeiras desta fase e que transcenderam a mesma ao longo de minha vida: Escolinha, Novela e Missa. Na Escolinha eu era o professor, na novela, era o ator principal, e na missa eu era o padre! Sinto que minha liderança foi semeada neste momento.

Na fantasia da escola aproveitava todos os momentos comemorativos para celebrar! Lembro dos coelhinhos onde, na falta de dinheiro para comprar chocolate, colocávamos açúcar. No dia da Independência saíamos desfilando pelas ruas mais próximas, no carnaval, a “laussa” (Urso cheiro de pêlos, fios de náilon, acompanhado de outras crianças batendo latas), as “catirinas”, recurso para fazer graça e ganhar um “trocadinhos”.

Na fantasia da novela, eu gostava de representar Carlos Alberto Richelle e minha amiga Nainha, a Bruna Lombardi. História que ultrapassou as décadas, hoje tornada memória afetiva por nós dois. Era curioso como dávamos continuidade aos capítulos, dia a dia, algumas horas depois de chegar da escola e almoçar. Ah! Eu também dirigia a novela.

Na fantasia da missa, eu me transformava num padre, pegava o folheto da liturgia entregue na Igreja (Espaço sagrado da manifestação artística) e realizava todo ritual com as demais crianças. O vinho era suco (K-SUCO) de uva, a hóstia era bolacha coquinho. O corpo e o sangue de Cristo na visão ingênua de algumas crianças cheias de sonhos.      

Tem uma história inesquecível! Dia 17 de julho de 1980. Aquelas crianças de rua (Principal palco de minha vida) começaram a explorar o barro multicolorido deixado por um trator que passara na rua na perspectiva de asfaltar (até hoje nada foi feito.) O barro já estava duro e começamos a riscar com as unhas, afinal, tocar no barro era uma prática infantil muito natural. Destes toques foram nascendo pequenos e grandes desenhos, flores, leões, casas, mamãe, poucos papais, carros, sol... naquela noite meu pai resolveu nos visitar, nos de alguns cruzeiros e compramos K-suco, bolinho de bacia e fizemos a primeira vernissage de nossas vidas.

Viva a rua! A rua da Glória hoje invadida pelas drogas... antes, invadida por uma tropa de crianças que gostavam de ser crianças!

Gilson Reis
24.10.13


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