Li dias atrás que a campanha Fora Feliciano
esfriou, que as adesões diminuíram o que me preocupou sobremaneira. A eleição do
pastor Feliciano representa um retrocesso no processo político do Brasil e uma
derrota para os grupos que lutam pela ética e justiça em nosso país. Lembro que
as mudanças mais significativas que tivemos foram resultado da ação do povo,
através de abaixo assinados, manifestações, campanhas para protestar e esclarecer
os mais desatentos. Por isso, para relembrar que não podemos aceitar a
permanência deste cidadão à frente desta tão importante Comissão, publico
artigo de Frei Beto, publicado na Folha de São Paulo – Tendências/Debates do dia
12/04/2013, cujo título, muito pertinente por sinal é, Infelicianeidade. Ele nos diz que “(...) Estamos
todos nós, defensores dos direitos humanos, às voltas com um pepino federal.
Nossos servidores na Câmara dos Deputados, aqueles
cujos altos salários são pagos pelo nosso bolso, (grifo meu) cometeram o
equívoco de eleger o deputado e pastor Marco Feliciano para presidir a Comissão
de Direitos Humanos e Minorias. O pastor deputado, filiado ao PSC-SP, escreveu
em seu Twitter: "Africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé”.
Isso é fato. Em outra mensagem, postou: "Entre meus inimigos na net (sic)
estão satanistas, homoafetivos, macumbeiros...". Em processo aberto no
Supremo Tribunal Federal, Feliciano é acusado de induzir ou incitar
discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia ou religião --crime sujeito à
prisão de um a três anos, além de multa. Em sua defesa, Feliciano afirma:
"Citando a Bíblia (...) africanos descendem de Cão (sic) (ou Cam), filho
de Noé”. E, como cristãos, cremos em bênçãos e, portanto, não podemos ignorar
as maldições". Que deus é esse que amaldiçoa seus próprios filhos? Essa
suposta teologia vigorou no Brasil colonial para justificar a escravidão”. O
Deus de Jesus ama incondicionalmente a todos. Ainda que O rejeitemos, Ele não
deixa de nos amar, conforme atestam a relação do profeta Oseias e sua mulher,
Gomer, e a parábola do Filho Pródigo. Todo fundamentalismo cristão é ancorado
na interpretação literal da Bíblia, que deriva da ignorância exegética e
teológica. Os criacionistas, por exemplo, acreditam que existiram um senhor
chamado Adão e uma senhora chamada Eva, dos quais somos descendentes (embora
não expliquem como, pois tiveram dois filhos homens, Caim e Abel...). Ora, Adão
em hebraico é terra, e Eva, vida. O autor bíblico quis acentuar que a vida, dom
maior de Deus, brota da terra. Ter Feliciano como presidente de uma comissão
tão importante --por culpa de legendas como PMDB, PSDB e PT-- é uma
infelicidade. Não condiz com o nome do deputado que, na roda do samba que está
obrigado a dançar, insiste no refrão: "Daqui não saio, daqui ninguém me
tira". O deputado é um pastor evangélico. Sua conduta deveria, no mínimo,
coincidir com os valores pregados por Jesus, que jamais discriminou alguém. Jesus
condenou o preconceito dos discípulos à mulher sírio-fenícia; atendeu solícito
o apelo do centurião romano (um pagão!) interessado na cura de seu servo;
deixou que uma mulher de má reputação lhe lavasse os pés com os próprios
cabelos, e ainda recriminou os que se escandalizaram ao presenciar a cena; e
não emitiu uma única frase moralista à samaritana adepta da rotatividade
conjugal, pois estava no sexto homem! Ao contrário, a ela Jesus se revelou como
o Messias. É direito intrínseco de todo ser humano, e também da democracia,
cada um pensar pela própria cabeça. Nada contra o pastor Feliciano, na
contramão do Evangelho, abominar negros e odiar homossexuais e adeptos da
macumba. Desde que não transforme seu preconceito em atitude discriminatória, e
seu mandato em retrocesso às conquistas que a sociedade brasileira alcança na
área dos direitos humanos. Estamos todos nós indignados frente ao impasse
armado pelo jogo político rasteiro da Câmara dos Deputados. Eis uma verdadeira
situação de infelicianeidade, com a qual não podemos nos conformar”. Frei
Betto, Carlos Alberto Libânio Christo,
68, é frade dominicano e autor de "Aldeia do Silêncio" (Rocco).
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