Uma comida para ter gosto bom, há de ser a realização culinária de um
sonho. A culinária é um triunfo da vontade amorosa. Ela obriga a natureza,
indiferente, a fazer amor conosco. A Cozinheira também deseja nos dá uma grande
felicidade. Para isso ela existe. Essa é a sua arte. Sua bíblia é o Kama Sutra
da boca, as infinitas maneiras de se fazer amor com os lábios, com a língua,
com o nariz, com as vísceras.
Assim era a Babette... Assim era EDJA: Sabiam os segredos do
prazer pela comida. Realizavam, na prática, aquilo que os psicanalistas
anunciam na teoria: é o “princípio do prazer” que estabelece o programa para
nossa vida. O conhecimento é guardado ao lado daquela panela de barro sobre o
fogão, que só tem sentido pela RABADA que dentro dela está fervendo. A panela é
um meio. A RABADA é o fim. O saber é um meio. O sabor é o fim.
EDJA, como qualquer NORDESTINA
ARRETADA gostava mesmo é de Banquete. E banquete é sinônimo de partilha,
sinaliza o desejo de estar junto. Mas um estar que se alimenta do alimento de
cada um. Dos temperos que gostamos, das receitas que apreciamos, doces ou
salgadas, e até sem doce e sem sal. No entanto, banquete não é só de alimento,
mas de vontades! Intenções! Sonhos! Banquete de corpos e mentes em
desejo!
Rubem Alves, em seu livro
Variações sobre o Prazer, fala, deliciosamente, acerca do ato de sentir, e
defende que as cozinheiras trabalham com efeitos sensíveis: O prazer tem de ser
gostoso; o prato tem de ser cheiroso; o prato tem de ser bonito; o prato tem de
ser excitante ao tato – por isso a pimenta, o cuidado para que não fique nem
mole nem duro demais -. Quando uma cozinheira pensa-cozinha ela leva em
consideração a totalidade dos efeitos práticos que o prato que ela está
preparando irá ter sobre aquele que vai degustá-lo. E finaliza dizendo que
todos os sentidos, sob a primazia da boca, se juntam para produzir o prato
imaginado.
Assim diria Babette,
cozinheira revolucionária do belo filme “A Festa de Babette” e EDJA, Cozinheira
revolucionária da bela vida digna de aplauso!!. O que há em comum e impactante
nas duas nobres cozinheiras é exatamente a sua percepção culinária pautada na
revolução dos sentimentos, o que, conseqüentemente, gesta no ventre dos
degustarores, novos desejos, vontade de mudança, novos sentidos e significados,
novos encontros, com novos toques, proximidade, olhares afetuosos e
libidinosos, uma verdade que se escondia por trás do “encouraçamento” familiar,
social...
Se me disserem que o
banquete se inicia na cozinha, com as panelas, fogões, utensílios, ingredientes
e temperos, eu direi que estão errados. O banquete se inicia com uma decisão de
amor.
Babette, com pena das
pessoas mirradas e mesquinhas que a inveja e o ressentimento tornara
insensíveis, na aldeia em que vivia, prepara um banquete que lhes daria uma
experiência inesquecível de prazer, beleza e generosidade.
EDJA, possuída por um
desejo de prazer, preparava os “sabores
que lhe permitissem fazer, na mesa, o amor que desejava fazer na cama”. Sonhava com os feitos que os sabores produziriam
no corpo de quem comesse. Não queria matar a fome. O que ela desejava era fazer
amor com quem come, através dos sabores.
Quando a fome está
satisfeita, o festival de amor chegou ao fim.
Eterna EDJA...