domingo, 2 de outubro de 2011

FÚRIA

















Vinde a mim àqueles que nada sabem.
Que ignoram como eu o onde, o quando, o fim...
Decifrai deste labirinto as incertezas que vos são comuns
E as que vos revolvem a alma.
Ponderai toda a sorte de impropérios, inquietações e divagações.
Saboreai seus sulcos indigestos, suas sutilezas funestas, suas agruras.
Atentai para que, ao vos iludires,
Não permitais vossa ruina e a de vosso próximo.
Aplacai a fúria de vossos lábios, que ferem como espada letal.
Vede, ao revés, o sucumbir de tolos escárnios diante de tamanha sapiência.
Não vos curveis frente insólita crença de felicidade e de dominação.
Ordenhai, nas pastagens inebriantes do tempo, tuas negras e brancas ovelhas.
Acalantai-as. Conduzi-as. Alimentai-as.
Sois de inegável natureza humana e, de tal sorte, promíscua.
Pertenceis a casta de deuses avalizados por históricos mortais
E, de certo, erigidos por civilizações mortas, dissipadas.
Ostentais, pois, seu poder e vos deleitais.
Deveras sois cria dessa glória.
Vinde mortais!
Reinai na realeza de tua temperança e de teu tédio.
Conjugai vossos verbos e recitai vossos salmos.
Não vos reduzais à escória.
Sedes resolutos e não eternizados em colossos perecíveis
Ao tempo e sua decadente ampulheta.
Mesmo fustigados pelos ventos que vos assolam,
Que vos torneis impávidos e sábios.
Conduzi vossa lírica mortal e cruzai o portal da vida e a sombra do indecifrável,
Onde nunca morrereis em vão.
E onde o que vos resguarde seja a quimera da liberdade
E a compreensão do saber.
Aplacai vossa fúria e aclamai vosso nome.
Que este jamais seja em vão.
Posto que, em vosso peito, recostais a verdade,
E nele, a força vos batize homem mortal.
Criador de deuses, anjos e serpentes.

30/09/2011 – 11:00
Chiquinho Silva

Um comentário:

  1. Chiquinho,
    Se vc tivesse escrito este texto há alguns mil anos atrás, tenho certeza que ele faria parte de um dos livros: Provérbios, eclesiastes ou eclesiástico... estaria por ali.
    Belíssimo!

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