quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A MULHER TRISTE



 Não sei dizer se era feliz. A conheço desde a tristeza.
Não lembro ter curtido alegrias e extravagâncias de felicidade.
Lembro-me sonhadora.
Mas também me lembro frágil diante do ato de sonhar.
Como se sonhar  lhe trouxesse dor.
Lembro-me com olhos de distância.
Também com olhos na direção dos desvios.
Não sabia apreciar olhos felizes.
Recordo-me escondida.
Algo dentro do corpo lhe era segredo percebido e não dito.
A alma dentro do corpo não lhe permitia o mistério.
Ela extravasava gritos silenciosos. 
Algo dentro da alma era ferida irritante.
Não calava, ainda em silêncio.
Lembro-me num canto.
Sua expressão era quase inexpressão.
Ou talvez sua inexpressão era um grito expressivo.
Era isso.
Desfila na memória a imagem dela, mulher menos.
Oposto de uma mulher mais!
Versão “mais” de sentimentos pouco nobres, fincado numa mulher cuja nobreza lhe é fato.
Via nela o que escondia.

Não. Eu não sei dizer se era feliz. A conheço desde a tristeza.
Por vezes, um vento sorrindo passeava nessa paisagem.
Lembro-me dela com sua janela na boca
Evitando uma paisagem de beleza agredida. 
Uma vez fechada a janela
O vento parecia passear durante outras estações.
E eu continuava vendo corpo e alma pedindo para se encontrarem mais livres.
Lembro-me presa.
A conheço desde a tristeza
Algumas vezes visitada pelas dores dos partos.
Instantes de felicidade (?) materna.
Ser mãe, este título nobre, talvez seja o máximo premio.
Sentimento de uma conquista digna de nota.
Não basta em si. É preciso o gozo.
Lembro-me cuidadosa.
Mãe coragem buscando suprir ausências e superar presenças.

Sim. A mulher triste amava.
Era de um amor triste, mas amor.



Homenagem à Sônia, minha cunhada, falecida neste sábado, 16.02.2013

4 comentários:

  1. Fazer da saudade, da dor e da ausência uma poesia só pode ser coisa de poeta. Meus sentimentos meu grande amigo. "Que Deus a tenha".
    Diria Francisco de Assis: "a morte nossa irmã".

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    1. AI LUIZA.
      ACHO QUE A MORTE É NOSSA MAIS PERVERSA IRMÃ!
      QUE CHICO ME PERDOE, MAS SEU AMOR A NATUREZA E TODA CRIAÇÃO VITAL VAI DE ÁGUA A BAIXO DIANTE DE TANTA TOLERÂNCIA AO QUE NOS FAZ ABDICAR DE TANTA BELEZA APRECIADA POR ELE. A NORTE NOS PRIVA.
      CHEIRO DE VIDA E VIDA EM ABUNDANCIA

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  2. Seu texto me remeteu `a Clarice Lispector - A Hora da Estrela (Macabea)

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  3. Pois é, estou lendo Clarice, sua biografia. Acho que contagiou.
    Ceça disse que o texto era muito real. De uma tristeza profunda. Eu fiquei mais triste depois que o escrevi.

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