sábado, 29 de outubro de 2011

Apresento a vocês o primeiro texto da nova autora do blog, Isa, que postará seus textos aos sábados. Seja bem-vinda!!!!!!!!!


Cantando eu mando a tristeza embora

A tristeza é senhora,

Desde que o samba é samba é assim.

A lágrima clara sobre a pele escura.

A noite, a chuva que cai lá fora.

Solidão apavora,

Tudo demorando em ser tão ruim,

Mas alguma coisa acontece

No quando agora em mim

Cantando eu mando a tristeza embora

(Caetano Veloso)


Eu gostaria de ter o poder de escrever com música, um compor que saísse assim todo notas, todo melodia, todo beleza, alegria e ternura de muitas canções, mas eu não sei. Gostaria também que as minhas palavras tivessem cheiro (elas têm quando as junto, mas não sei grudar isso no texto). Não me preocupa que as palavras tenham cor, talvez por ser esse um recurso possível, mas, música e cheiro seriam fundamentais.

Na verdade, acho que a minha vida é assim, toda palavras, músicas e cheiros. O olfato é um sentido muito discreto, pois podemos ativá-lo, silenciosa e secretamente, em qualquer lugar, eternizando os odores em nossa alma. Pena que nem todos os ambientes nos permitam nos expandir através da música; pena que às vezes as pessoas mais próximas de nós se incomodem com a música, em vez de apreciá-la, de se entregar a ela e, por isso, só possamos ouvir o silêncio... Mas, enfim, sou, desde sempre e para sempre, uma pessoa cheiros, palavras e canções.

Esses dias, candidatei-me para doação de medula devido ao apelo de um colega de trabalho, de vinte e poucos anos, que necessitava de um transplante, e procurei incentivar outras pessoas a fazerem o mesmo. Hoje, soube que ele morreu, talvez por falta de um doador compatível ou por causa da lentidão do sistema de saúde nos processos de doação. Enfim, precisava tão pouco para ele viver e esse pouco não chegou. E talvez eu mesma não possa mais ser uma doadora, apesar da minha vontade de fazê-lo.

Também por esses dias, soube que tenho uma doença degenerativa progressiva na coluna (por isso me pareço tanto com oQuasímodo, de Notredame, só que mais alta). Bem, temos de reconhecer, antes de tudo, o poder da ambiguidade das palavras: progresso parece sempre algo tão bom, mas, no caso da minha envergadura lombar, a palavra progressiva não guarda em si nada de bom, pois...

...soube também que precisarei fazer uma cirurgia na coluna e, como não sou mulher de embromação (capricorniana pra quê, afinal?), decidi resolver logo isso e marcar a cirurgia, que será nos próximos dias, vencida a burocracia do convênio. E até mesmo essa tristeza tem cheiro e tem canção. O cheiro é de orvalho no capim de manhãzinha e, da canção, vocês viram um trecho acima, afinal, mesmo quando a solidão apavora, porque as pessoas mais queridas têm o seu próprio centro de gravitação e nem sempre podem estar próximas, disponíveis, acessíveis, ao alcance de nosso medo, insegurança e dor, fazendo com que tudo se demore em ser tão ruim, alguma coisa sempre acontece no quando agora em mim e, cantando, eu mando a tristeza embora...

Acho que agora era um bom momento para dançar um xote do Fala Mansa. Xote com cheiro de bala de goma. Pena que o Bruno Andaluz, meu parceiro de quase todas as coisas na vida, de caspa a calo, não esteja aqui. Afinal, sabe-se lá se depois do bisturi me restará molejo para dançar! Quanto tempo terei de ficar acamada, impossibilitada, reduzida, diminuída, limitada? Ah, como é triste ter asas e não poder voar! E quanta gente pode e não voa!

Bem, não sei se este texto, assim desprovido de cheiro, de poesia, de nexo e de canção, é um bom texto para estrear na sala solene do blog, mas, só sei escrever com o coração, e hoje ele está assim meio silencioso, meio calado, tentando ouvir a resposta para a pergunta que meu colega de trabalho deve ter-se feito ao descobrir a leucemia e que eu também me faço: por que agora, quando a vida está tão plena? Por que tão sério? Por que tão cedo? Por que motivos eu? Mas, mesmo que a solidão, mais que a dor física, mais que a incerteza, apavore, fazendo com que tudo demore em ser tão ruim, eu sou a Isa, e alguma coisa sempre acontece no quando agora em mim e, cantando, eu mando a tristeza embora... Cantando, eu mando a tristeza embora.

Isa Oliveira

7 comentários:

  1. Eu tenho uma amiga,
    A Dama da Letras,
    Esculpida por Deus no barro da Sabedoria.
    Sua alma, canção que embala aqueles que estão à sua volta.
    Seus olhos reverberam as notas do cotidiano,
    Transformando-as em melodia
    Através do instrumento que ela toca com maestria – as palavras.
    Eu tenho uma amiga,
    Que fez sentir-me Dulce
    E mostrou-me estrelas
    Que eu nunca notei que existiam.
    Levou-me, pelas mãos do escritor amado,
    a passear de canoa pelo rio Araguaia
    e a caminhar por uma rua descalça, aonde habitavam anjos e humanos
    Eu tenho uma amiga
    Que é feita de carne, osso e poesia.
    Que sorri, mas que também chora.
    Que é corajosa, mas que também tem medo.
    Que é forte, mas que também precisa de colo.
    Que tem asas - voa, mas que também pousa.
    Que caminha e que vai continuar caminhando
    Porque nesta estrada, ela não está sozinha.
    Eu tenho uma amiga.
    Nós temos esta amiga,
    E Isa, esta amiga, nos tem sempre.

    Maria Mercedes

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  2. Olá Isa
    Seja bem vinda para o clube dos enganchados. Desta forma enganchados podemos dizer que estamos juntos não só no blog, mas na vida, no cotidiano. Estou aqui e me ofereço em orações por você neste seu momento de solidão, diria um focolarino: me uno à você neste momento embora não seja focolarina, gosto da palavra unidade e assim me sinto unida à você para tentar sentir junto com você esta sua dor...
    Estou feliz com você no grupo, sei que o blog certamente ficará mais rico.

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  3. ISa,
    Nem sei o que dizer. Conheci você a tão pouco tempo e a imagem que tenho de ti é de uma pessoa decidida, determinada, alegre, que gosta de estar com os amigos, gosta da palavras, gosta de declarar seu amor sobretudo pelo Dagô e pelo Bruno como fez nesse texto.
    O seu texto ficou lindo, de fato escrito com o coração. Fiquei triste, também silencioso ante as suas palavras. Estou torcendo por você.

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  4. Isa querida, usarei a letra de uma música de Chico Buarque:
    Certo de estar perto da alegria,
    comunico oficialmente
    que há lugar na poesia.
    Pode ser que você tenha um carinho prá dar
    ou venha prá se desculpar,
    seja lá como for, venha sorrindo.
    Ah! bem vinda, bem vinda, bem vinda,
    ai que bom que você veio
    e você chegou tão linda,
    eu não cantei em vão.
    Bem vinda, bem vinda, bem vinda,
    bem vinda, bem vida no meu coração.
    Marli Pereira

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  5. Bem vinda!!!
    Conheço-lhe pouco... No entanto, este pouco me faz pensar como o Lau: uma mulher determinada e de fibra e, sobretudo, de muita fé e energia.
    Por isso sigo acreditando que "alguma coisa aconteceá no quando agora em ti e cantando sua tristeza irá embora".
    MUITA ESPERANÇA!
    MUITA FORÇA!
    Chikinho

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  6. "Eu gosto dos que tem fome, dos que morrem de vontade, dos que ardem!"
    Assim é a Isa.
    Contigo quero tambem sentir essa fome, esta vontade e arder!
    Já eras presente na ausencia, como bem expressa Rubem Alves, agora a tua presença se intensifica...
    curioso é que a ausencia presente será ainda mais intensa!
    Cheiro de abraço dagôniano!

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